dIÁRIO DE nOTíCIAS

Neste dia Internacional da Educação, o fundador da Escola da Ponte diz que é preciso rasgar um modelo de escola que vem do século XIX, que "condena à ignorância" e não cumpre o direito constitucional de "uma educação para todos".

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José Pacheco anda há quase 50 anos a criar, como diz, a "utopia" da educação. O seu projeto implementado ainda na década de 1970, Escola da Ponte, na Vila das Aves, é referência citada em todo o mundo quando se debatem modelos educativos.

 

Há 20 anos entre Portugal e o Brasil, onde replicou o modelo da Ponte em vários projetos que acompanha, do Âncora à Escola Aberta de São Paulo, o professor e pedagogo portuense continua a lutar, aos 70 anos, contra um modelo de escola que, diz, promove a ignorância e não respeita a Constituição.



Quarenta e seis anos depois de ter fundado a Escola da Ponte, abraça agora um novo projeto, o Open Learning School, que abriu em Portugal como A Quinta, a primeira escola de aprendizagem aberta com iniciativa privada no país. "Eu sou um professor de escola pública, mas não posso ser preconceituoso. Se a escola pública não faz, que outros façam", diz José Pacheco, que anuncia ainda para julho um grande congresso internacional, em três locais do interior de Portugal, onde vão "reunir mais de 150 projetos de cinco países diferentes para debater as novas construções sociais de Educação" e mostrar que "outra escola" é possível.

 

Diz que temos alunos do século XXI, com professores do século XX, a trabalhar como no século XIX. Porquê?

 

Este modelo correspondeu a necessidades sociais da primeira revolução industrial. Mas nós vamos já na quarta, ou quinta. No início do século XX, houve uma tentativa de resgate daquilo que é a humanização da educação. Da Maria Montessori à pedagogia Waldorf, etc... Só que isso só aconteceu em duas escolas durante o século XX: em Reggio Emilia, na Itália, e na Escola da Ponte, em Portugal. Mas entrámos no século XXI e a maioria das escolas, quase a totalidade, funciona com um modelo herdado do século XIX, da Revolução Industrial, da produção em série. E o resultado está à vista. É uma Escola fora da lei e à margem das ciências da educação. Aliás, ainda há poucos dias recebi do meu amigo António Nóvoa um texto que sintetiza as conclusões de um estudo da OCDE e da Unesco, que diz que este modelo escolar não funciona. Basta olhar para a quantidade de jovens que estão em centros de explicações, centros de estudo, para as doenças dos professores, para o suicídio juvenil...

 

É esse modelo do século XIX que "condena à ignorância", para continuar a usar palavras suas?

 

É evidente. Os alunos não aprendem; decoram, colocam num papel e esquecem. A escola não cumpre aquilo que está na Constituição da República. O que está na lei é que a escola deve garantir o direito à educação a todos. Mas eu pergunto: a todos? Mais de metade são marginalizados. Mesmo aqueles que fazem testes bem feitos. Um dia perguntei a uma colega: Sabes fazer raiz quadrada. Ela: "Não". Tiveste aulas de raiz quadrada? "Tive". Fizeste teste? "Fiz". Mostraste que sabias? "Mostrei". E tu sabes? "Não". Quantas vezes na tua vida precisaste de raiz quadrada? "Nunca". Já perguntei isto a milhares de pessoas.

 

A educação do futuro é aquela que o prof. José Pacheco já vislumbrou em 1976, na Escola da Ponte?

 

Há tempos um senador brasileiro convidou-me para ir a casa dele e disse que precisava de mim porque ele ia à Unesco para apresentar um projeto. Então eu perguntei-lhe que projeto era e ele disse-me que era sobre a educação do futuro. Caramba, há 50 anos que ouço falar da educação do futuro, e essa educação nunca mais chega. Temos de olhar para a Escola Aberta, temos de olhar para o Projeto Âncora e, agora, para a Open Learning School e ver o que está a acontecer. A educação do futuro já está aí, hoje, agora.

Jornal Diário de Notícias, 24 de Janeiro de 2022


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